
Amélia era mulher de verdade, Amália é.
Gravidez na adolescência, mudanças de cidade, filhos e profissão essa é a trajetória dela
Por Karen Cardoso
“Vai doer e você vai agüentar”, é assim que nossa personagem repassa a filosofia de sua mãe. Nascida em 12 de fevereiro de 1970, filha de Maria Marta e José Reinando, ela foi registrada somente com o sobrenome materno, Amália Cardoso Florentino e já tinha três irmãos à espera, um inclusive dizia para sua mãe dar aquele bebê para os outros, pois ele chorava demais.
Mas voltando a filosofia do começo da história. Ela apareceu em um momento de extrema tensão da vida de nossa personagem: visita ao dentista. “Lembro que eu estava meio assustada, dentista sempre deixa a gente apreensivo né? Virei para minha mãe e perguntei na maior inocência: ‘Mãe, vai doer?’ e ela sem nenhuma meiguice nos olhos respondeu: ‘Vai doer e você vai aguentar’. O mais interessante é que somente depois de anos fui entender que isso foi necessário no momento e para o resto da minha vida”, conta Amália.
O reino de única filha acabou quando Amália, que agora se chamava Amália Cardoso Mariano, pois tinha colocado o sobrenome de seu pai, tinha 15 anos: nasceu Luizzi, sua irmã mais nova. Mais que irmã, Amália era praticamente mãe da pequena que quando começou a falar, só a chamava de “Babália”, depois “Babá”, e mais adiante de “Bá”. “Aprendi a ser mãe naquele momento, a Luizzi só queria ficar comigo. Até para namorar que já era difícil por ter um pai tão severo, ficou ainda mais complicado. Eu podia estar saindo, se ela chorasse que queria ficar comigo, tinha que esquecer a rua e voltar. Mas essa experiência foi a base para o que viria nos dois anos seguintes”, relembra.
Entre idas e vindas, Claudinei de primo de quarto grau, se tornou seu namorado e por deslize também a engravidou aos 17 anos. Um susto para ambos no início, mas a decisão madura dos dois foi o casamento. Com cinco meses de gravidez, e alguns quilos a mais, que lhe custou o vestido de noiva, pois não entrou, Amália subiu ao altar no dia 27 de novembro pra casar com seu noivo de apenas 23 anos. Vida nova: marido, casa, filho, trabalho.
Mãe, mulher, profissional
No dia 6 de abril, nasceu a primeira filha de nossa personagem, Karen e porque não dizer, acabou o sossego de Amália, afinal nesse dia mal sabia ela que energia que ela precisaria ter era muito maior do que apenas estudar e trabalhar. “Ela chegava perto de mim, me chamava para brincar e eu parava qualquer coisa para atender a esse pedido, mas o trabalho que ela me deu foi imenso com o passar dos anos, custosa, mas era só eu falar que ela logo obedecia, ou levava umas palmadinhas (risos)”, se diverte a nossa heroína.
O fato de ter tido filhos, não fez com que a senhora Alves (afinal, ela casou, nome agora é do marido) deixasse o profissional de lado. Professora de pré-escola, ensino fundamental e médio, continuou se desdobrando para estar sempre presente com a filha, e também ajudando financeiramente em casa. Os anos se passaram, Amália sofreu uma perda de um filho e até pensou em não se arriscar novamente na maternidade, entretanto o destino lhe prega uma peça e lhe concede o direito de ser mãe de mais uma menina, Mariana.
Casada, com duas filhas, ela se vê novamente frente a frente a filosofia de sua mãe: “Vai doer e você vai agüentar”. Dessa vez não era dentista, mas sim uma mudança. Claudinei ia trabalhar em outra cidade e ela estaria pela primeira vez longe de sua família. E o conselho de criança serviu para que Amália percebesse que ela era o pilar da sua casa. Enquanto todos choravam pela distancia, ela confortava. E assim mudaram.
Por um bom tempo ela foi apenas mãe e dona de casa, até que retornou aos estudos depois de tanto tempo de sua formação acadêmica em História. Faria pós-graduação. Essa retomada abriu as portas para um novo momento: ser professora universitária. Com isso veio o maior reconhecimento e também a maior dedicação ao trabalho e ao conhecimento que deveria adquirir. Outra pós e depois o mestrado.
Antes de tudo, ela recebeu um presente, mais um filho, mas dessa vez ele já veio pronto e embalado, Ivan já tinha 14 anos e apesar de ser seu afilhado, era um novo desafio a se enfrentar, um adolescente. “O receio era que fosse uma substituição do filho que perdi, mas não foi. Tudo caminhou de forma natural. A Karen demorou um pouco pra aceitar uma nova pessoa na família, já a Mariana o amou de cara e o Claudinei não admitiu mais que não fosse considerado seu filho”, conta a professora de Sociologia.
Se fazendo em mil, começou o mestrado, com apoio dos filhos que já estavam maiores e do marido que ajudava como podia. Até que mais uma vez se viu no momento de largar tudo e seguir ao coração, Claudinei iria trabalhar no Paraguai. Outro país, outra língua, ainda mais distante. Filosofia passada na mente e na atitude, encarou e foi, passou seis meses por lá, aprendendo assim como seus filhos. Só retornou para vencer mais uma etapa de sua carreira, agora ela era Mestre.
“Sempre segui o Claudinei e acho que devo continuar seguindo, onde fui, seja o Paracatu, Paraguai e até em Macapá, consegui arrumar emprego na minha área, cresci muito e aprendi com o tempo. E sei que dar esse apoio ao meu marido, fez com que ele tivesse mais coragem para encarar novos desafios em qualquer momento, com qualquer idade”, ressalta Amália.
Futuro
Aos 41 anos, com filhos já crescidos e criados, os planos acabam sendo mais para ela. Mais uma aventura a se enfrentar é viajar toda semana para acompanhar as aulas como aluna especial do doutorado em Goiânia. Entretanto não se sabe bem até quando isso vai durar, pois mais uma vez ela vai largar tudo e se mudar para a cidade onde seu marido está morando, Betim. “Se realmente tiver que largar tudo, vou largar e recomeçar em outro lugar. Vou passar mais uma vez noites lendo e escrevendo para fazer meu doutorado”, afirma.
Parar é um verbo que não está no seu vocabulário, seja trabalhando, estudando, viajando, mudando. “Problema todo mundo tem, a vida não é fácil, mas é preciso enfrentar, seguir em frente e vencer. Doer, sempre dói, mas é preciso agüentar e eu sempre brinco: Amélia era mulher de verdade, Amália é”, finaliza.
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