quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Sobre Eles*

Quando ela lhe dava boa noite, ele nem percebia, pois ela era suave e não o deixava mais perceber que estava ali. Não passava mais do que uma linda voz interna que se repetia em sua cabeça atormentada e cheia de dúvidas sobre a vida. Daí ele se lembrou do dia em que ela se foi. O quão triste foi pra ele, pra sua família e pra todos em sua volta.Ele sabia que ela nunca voltaria e que nunca mais ouviria sua voz ao pé do ouvido, não sentiria seu cheiro único de uma pele branca cheia de pintas estrategicamente aleatórias.

Era um dia quente por isso ela colocou aquele vestido azul de bolinhas brancas e se caracterizou como a mulher que era mesmo. Com os cabelos pretos e alguns já brancos, ela se divertiu quando brincou com as cores e pensou em sua mãe quando se trocou e arrumou o cabelo, e quando passou sua maquilagem deixando apenas suas bochechas rosas, lembrou que era como ele sempre gostava de ver.

Ela estava tão linda, parecia que sabia que era seu último dia com ele. Ela estava cheia de romance porque sabia que era preciso gastar tudo num só dia. E aquele era o dia. Ela sabia.

Quando ele a viu, ficou maravilhado, como sempre ficava. Ele sempre dizia pra ela que era a mulher mais linda que ele já havia visto de perto. E ela chorava, toda vez, com medo de não ser essa mulher todos os dias. Porque uma hora ele mudaria de opinião.

Ele estava eufórico. Sabia que algo aconteceria. Ao ver ela entrando no carro com aqueles saltos laranjas de cortiça, pensou que aquele iria ser o dia. Da alforria.

Ele estava lindo, e encantado com ela. Tão encantado que não sabia onde se colocava ao seu lado. Se na frente, se ao lado, se atrás.

Ele estava alterado, soava frio, e não entendia o sentido daquilo tudo. Só sabia que fazia parte...

Era dia de estréia. E ela que tão loucamente sempre adorava as suas tão poucas noites de tapete vermelho, sentou-se e o manteve em pé. Sentada, agarrou seu homem com força e tomou suas pernas fortes nos seus braços, e acariciava sua calça jeans. E a cada momento que o filme lhe trazia algo familiar, ela o apertava. Lhe mostrava que entendia o porquê daquela cena e o porquê daquilo tudo. Ela achava que entendia. Porque é intrínseco nela achar que sabe do que se trata as coisas. Pouco sabia.

Naquele dia, depois de pouca bebida e muitos abraços e pouco amor entre si, eles se perderam...

Nesse dia, ela foi acidentalmente morta por um de seus admiradores. Ela era a atriz principal daquele filme que ele fez questão de escrever.


*De alguém que aprendi a admirar

2 comentários:

Guilherme Gonçalves Damasceno disse...

Pitacando.

Todos somos roteiristas de nosso filme, e, talvez, também os atores principais (espero). Que sorte, a dela.

Eu também vivo achando que sei das coisas, mas não sei se mais acho ou menos sei.

Beijo, tia.

Bruno Pena disse...

"Uma mulher perdoará um homem por tentar seduzi-la, mas não o homem que perde essa oportunidade quando ela lhe é oferecida."
Charles Talleyrand-Périgord