Recém chegada à China, estava muito curiosa para saber como é viver num país comunista em pleno processo de capitalização. Fiquei hospedada na casa do Bill, um chinês de 24 anos, estatístico, que mora com os pais. Comecei a puxar papo sobre como era viver na China. Perguntei sobre as diferenças de classes e tal. "A China é o paraíso para os ricos e o inferno para os pobres", disse ele. Esta resposta me instigou ainda mais.
Abordei vários assuntos nesta maquiada entrevista, como o conflito com o Tibet, a política do filho único, o processo de abertura econômica, a liberdade de expressão, etc. Então antes mesmo de começar a relatar o que ele me falou quero preparar-lhes. O que vou escrever nessas próximas linhas é muito chocante. Foi também para mim verdadeiro choque cultural nu e cru. Então se você acha que não irá te fazer bem saber sobre atrocidades que acontecem na China pare agora! Mas se você tem estômago de elefante, vá em frente.
Ele me deu uma breve aula de história: A guerra civil chinesa durou 4 anos (1945-1949), e o vencedor foi Mao Tse Tung. Ele instituiu a República Popular da China. Os capitalistas fugiram para Taiwan e lá continuaram a levar a economia capitalista sobre a guarda dos Estados Unidos. Neste contexto de capitalismo e comunismo Mao Tse Tung queria preparar a China comunista para a esperada terceira guerra mundial. Passou então a estimular as mulheres chinesas para que tivessem mais e mais filhos, o que para ele significava mais soldados para as futuras tropas. Algumas chegavam a ter até dez filhos. Por essas e outras, Mao TseTung era conhecido como o Rei das Mães da China.
A terceira guerra mundial, como todos sabem, não chegou a acontecer de fato, mas o crescimento em progressão geométrica da população da China de fato ocorreu. Com a morte da Mao os novos governantes tiveram que aplicar políticas para conter o boom populacional. Foi ai que instituíram a política do filho único. Qualquer casal chinês tem direito a ter um filho, caso tenha mais de um tem que pagar multas altíssimas para o governo comunista, multas que chegam a levar famílias à falência. Isso faz cerca de trinta anos.
Perguntei ao Bill o que esta política gerou de consequência para a nova juventude chinesa. Por serem todos filhos únicos, a juventude é criada cheia de mimos e superproteção. Os pais matam e morrem por eles. Bill, por exemplo, não sabe nem ligar a máquina de lavar roupa, não tira um prato da mesa, nunca arruma a cama, porque a mãe faz tudo isso por ele. Esses são só alguns rasos exemplos de como são mimados os frutos da política do filho único.
Ele me disse ainda que no interior, onde a pobreza é generalizada, quando o bebê é uma menina eles simplesmente as jogam fora. Mas em algumas regiões, como na divisa com Hong Kong, eles acreditam que a sopa de bebês (meninas) ajuda na ereção dos homens. Sendo assim, as mães que jogariam as recém-nascidas fora às vendem para os restaurantes que cozinham este prato como antídoto para a impotência. Eu sei o que você está pensando neste momento. Eu fiquei chocada também. Na realidade estou chocada até agora.
Claro que para o Bill isso também é absurdo, mas ele me deu uma explicação curiosa. Com o estabelecimento do comunismo, o governo destruiu muitos dos templos budistas e proibiu toda e qualquer manifestação pública de religiosidade. Com isso, as pessoas passaram a se desapegar dos valores morais e muitos perderam a noção de certo e errado. Segundo Bill isso é o que pode acontecer numa sociedade sem religião, uma sociedade que acha que o que fazemos aqui nesta vida nada nos trará no futuro ou até no pós-morte. Eu concordo com ele, é preciso ser muito desprendido de valores morais e até éticos para fazer atrocidades como comer sopa de bebês. Claro que isto esta também aliado à extrema pobreza e ao rigoroso regime de controle populacional da China.
Para manter a prosa engajada no mesmo assunto aproveitei a deixa que ele me deu sobre religião e perguntei sobre o conflito com o Tibet. Eu particularmente tentei aplicar para o visto do Tibet e se você não tem dinheiro é praticamente impossível consegui-lo. Para ir ao Tibet você precisa fazer parte das excursões promovidas pela agência de turismo do Tibet, vulgo Governo Chinês. Você não pode ir pra lá por conta própria, precisa estar sob a guarda do governo. Eles não querem mais alarde sobre o que tem acontecido por lá.
Mas voltando à minha entrevista com o Bill; ele me disse que a Região Autônoma do Tibet sempre teve algumas regalias em termos de abertura religiosa por parte do governo comunista. Mas quando o Dalai Lama começou a falar de liberdade e independência para o Tibet o governo não admitiu e foi para cima com tudo. Matou os monges e se instalou novamente por lá. Eu então questionei Bill sobre a sua opinião pessoal. Você gostaria de ver o Tibet independente? "Eu gostaria muito de ver o Tibet independente, mas não acredito que isso vá acontecer antes que a própria China se torne livre", ponderou.
Com a morte de Mao Tse Tung há trinta anos a abertura da China está acontecendo quase que naturalmente, mas ainda há muito a ser feito. Economicamente falando a China é um país praticamente capitalista, você encontra todas as grandes marcas por aqui, as pessoas consomem normalmente, o custo de vida e a margem de salário é semelhante ao que temos no Brasil. Em contrapartida, a abertura social e cultural ainda esta muito aquém.
Questionei o Bill sobre a possibilidade de haver uma revolução para a liberdade de expressão e ele disse que não acreditava que isso poderia acontecer um dia. Eu estranhei a frieza dessa resposta e pedi uma explicação para tamanha desesperança. Ele disse sem nenhum pudor, que a geração dele (frutos da política do filho único) é muito mimada e superprotegida. Os jovens iguais a ele nunca teriam coragem de se colocar à frente dos tanques de guerra como fez o estudante chinês no Protesto na Praça da Paz celestial, em Pequim há vinte anos.
Abordei vários assuntos nesta maquiada entrevista, como o conflito com o Tibet, a política do filho único, o processo de abertura econômica, a liberdade de expressão, etc. Então antes mesmo de começar a relatar o que ele me falou quero preparar-lhes. O que vou escrever nessas próximas linhas é muito chocante. Foi também para mim verdadeiro choque cultural nu e cru. Então se você acha que não irá te fazer bem saber sobre atrocidades que acontecem na China pare agora! Mas se você tem estômago de elefante, vá em frente.
Ele me deu uma breve aula de história: A guerra civil chinesa durou 4 anos (1945-1949), e o vencedor foi Mao Tse Tung. Ele instituiu a República Popular da China. Os capitalistas fugiram para Taiwan e lá continuaram a levar a economia capitalista sobre a guarda dos Estados Unidos. Neste contexto de capitalismo e comunismo Mao Tse Tung queria preparar a China comunista para a esperada terceira guerra mundial. Passou então a estimular as mulheres chinesas para que tivessem mais e mais filhos, o que para ele significava mais soldados para as futuras tropas. Algumas chegavam a ter até dez filhos. Por essas e outras, Mao TseTung era conhecido como o Rei das Mães da China.
A terceira guerra mundial, como todos sabem, não chegou a acontecer de fato, mas o crescimento em progressão geométrica da população da China de fato ocorreu. Com a morte da Mao os novos governantes tiveram que aplicar políticas para conter o boom populacional. Foi ai que instituíram a política do filho único. Qualquer casal chinês tem direito a ter um filho, caso tenha mais de um tem que pagar multas altíssimas para o governo comunista, multas que chegam a levar famílias à falência. Isso faz cerca de trinta anos.
Perguntei ao Bill o que esta política gerou de consequência para a nova juventude chinesa. Por serem todos filhos únicos, a juventude é criada cheia de mimos e superproteção. Os pais matam e morrem por eles. Bill, por exemplo, não sabe nem ligar a máquina de lavar roupa, não tira um prato da mesa, nunca arruma a cama, porque a mãe faz tudo isso por ele. Esses são só alguns rasos exemplos de como são mimados os frutos da política do filho único.
Ele me disse ainda que no interior, onde a pobreza é generalizada, quando o bebê é uma menina eles simplesmente as jogam fora. Mas em algumas regiões, como na divisa com Hong Kong, eles acreditam que a sopa de bebês (meninas) ajuda na ereção dos homens. Sendo assim, as mães que jogariam as recém-nascidas fora às vendem para os restaurantes que cozinham este prato como antídoto para a impotência. Eu sei o que você está pensando neste momento. Eu fiquei chocada também. Na realidade estou chocada até agora.
Claro que para o Bill isso também é absurdo, mas ele me deu uma explicação curiosa. Com o estabelecimento do comunismo, o governo destruiu muitos dos templos budistas e proibiu toda e qualquer manifestação pública de religiosidade. Com isso, as pessoas passaram a se desapegar dos valores morais e muitos perderam a noção de certo e errado. Segundo Bill isso é o que pode acontecer numa sociedade sem religião, uma sociedade que acha que o que fazemos aqui nesta vida nada nos trará no futuro ou até no pós-morte. Eu concordo com ele, é preciso ser muito desprendido de valores morais e até éticos para fazer atrocidades como comer sopa de bebês. Claro que isto esta também aliado à extrema pobreza e ao rigoroso regime de controle populacional da China.
Para manter a prosa engajada no mesmo assunto aproveitei a deixa que ele me deu sobre religião e perguntei sobre o conflito com o Tibet. Eu particularmente tentei aplicar para o visto do Tibet e se você não tem dinheiro é praticamente impossível consegui-lo. Para ir ao Tibet você precisa fazer parte das excursões promovidas pela agência de turismo do Tibet, vulgo Governo Chinês. Você não pode ir pra lá por conta própria, precisa estar sob a guarda do governo. Eles não querem mais alarde sobre o que tem acontecido por lá.
Mas voltando à minha entrevista com o Bill; ele me disse que a Região Autônoma do Tibet sempre teve algumas regalias em termos de abertura religiosa por parte do governo comunista. Mas quando o Dalai Lama começou a falar de liberdade e independência para o Tibet o governo não admitiu e foi para cima com tudo. Matou os monges e se instalou novamente por lá. Eu então questionei Bill sobre a sua opinião pessoal. Você gostaria de ver o Tibet independente? "Eu gostaria muito de ver o Tibet independente, mas não acredito que isso vá acontecer antes que a própria China se torne livre", ponderou.
Com a morte de Mao Tse Tung há trinta anos a abertura da China está acontecendo quase que naturalmente, mas ainda há muito a ser feito. Economicamente falando a China é um país praticamente capitalista, você encontra todas as grandes marcas por aqui, as pessoas consomem normalmente, o custo de vida e a margem de salário é semelhante ao que temos no Brasil. Em contrapartida, a abertura social e cultural ainda esta muito aquém.
Questionei o Bill sobre a possibilidade de haver uma revolução para a liberdade de expressão e ele disse que não acreditava que isso poderia acontecer um dia. Eu estranhei a frieza dessa resposta e pedi uma explicação para tamanha desesperança. Ele disse sem nenhum pudor, que a geração dele (frutos da política do filho único) é muito mimada e superprotegida. Os jovens iguais a ele nunca teriam coragem de se colocar à frente dos tanques de guerra como fez o estudante chinês no Protesto na Praça da Paz celestial, em Pequim há vinte anos.
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